sábado, 13 de novembro de 2010

Quatro meses

Demorei alguns dias para fotografar as folhas amarelas das árvores e o tempo não me perdoou: agora elas estão marrons. Não que o espetáculo das folhas marrons seja menos belo que o das folhas amarelas. Mas é que a recordação ficará marcada pelo sentimento de que, nessa súbita mudança, deixei algo essencial escapar por muito pouco.

Bem que me avisaram que a transformação na paisagem seria rápida! Mas - que merda! - não fui rápido o suficiente. Por negligência ou excesso de confiança (isso pouco importa agora), deixei o momento exato passar. E o que resta para o presente é apenas a constatação de que aquele amarelo não voltará mais. Pelo menos, não para mim. Porque, no próximo ano, não estarei em Paris nessa mesma época para ver o ciclo da vida se repetir. Ops... Eu disse "ciclo"?!

Ora, talvez a vida não seja feita de ciclos como as estações que se repetem. Pois afinal, pensando bem, as estações não se repetem: as folhas amarelas deste ano não serão as mesmas folhas amarelas do próximo ano, porque os brotos da primavera despontarão pela primeira vez em toda a história. Nesse sentido, a história não tem volta, pois cada fato é singular. O que passou, passou para sempre, e, ainda que volte, não poderá ser comparado. Porque o mesmo não é o mesmo, jamais.

Não que eu prefira pensar assim... Afinal, em relação à história cíclica, acho que a história sem volta é, na verdade, até mais difícil.

Sim, mais difícil, porque se a história se repetisse, eu poderia pensar, de alguma forma, em melhorar. Poderia prometer a mim mesmo que, na próxima vez, não me atrasaria. Ah, a "próxima vez"... Pensar nas repetições é tão reconfortante! É quase como viajar no tempo: poder voltar ao passado com a consciência do presente e, como nos filmes, corrigir todos os erros. Tão simples quanto reescrever partes de um texto que, somente depois de escritas, vejo que ficaram ruins.

No próximo outono, tudo será diferente, ainda que tudo se pareça com o mesmo de agora, seja em Paris ou onde quer que eu esteja. Pois, na realidade, a repetição do mesmo é simplesmente impossível. Futuro: sinônimo de incerteza e, ao mesmo tempo, de possibilidades de sonho. Tempo de rê-ver meus desejos. Tento me convencer de que pensar assim seria motivo de esperança, de que poderia me sentir feliz diante do imprevisível. Mas hoje, depois de ver aquelas folhas marrons sabendo que há apenas alguns dias elas eram amarelas, senti um certo pesar. Porque, além das fotos que tirei, ficarei também com a lembrança de algo que era único mas que perdi para sempre, só porque cheguei tarde demais...

6 comentários:

  1. Poético e um tanto triste. O post lembra bastante Cecília Meireles. Mas sugiro que você viva o presente. Se não deu, não deu; haverá outras oportunidades. O pior sentimento que pode acontecer é o de arrependimento, pois ele trabalha com uma matéria morta (o passado). Pense positivamente! Não se prenda. Alles gute. Hiro

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  2. Pensamentos práticos assim devem levar a uma vida feliz, ou, pelo menos, a algum tipo de "vida".

    E pensar que o engenheiro era eu...
    Abraços.

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  3. A pior vida que se pode ter é aquela que não é vivida. Não deixe que o mar de possibilidades à sua frente cegue as suas decisões e, principalmente, suas atitudes. Have fun. Hiro

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  4. Uma vez, me sentindo um pouco assim, escrevi:

    "O chão coberto com o que caiu
    E o olhar para o alto, esperando o que vai nascer"

    Nem sempre olho para cima, confesso. Meu olhar sempre retorna para o chão. Mas é nele que a gente pisa, nosso chão, nossa raiz!, pra seguir andando. A vida inteira pra aprender, de fato, tudo isso.

    Lindo o que você escreveu. And, yeah, HAVE FUN!

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  5. Carla, minha querida amiga poetisa e atriz,

    Já disse por e-mail, mas vou dizer publicamente também: seu comentário foi uma das coisas mais lindas que recebi na vida! Palavras encantadoras que, como um presente mágico, me encantaram... Vou me lembrar delas sempre que me sentir triste.

    Simplesmente amei.

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