segunda-feira, 26 de julho de 2010

Souvenirs de Paris

Hoje comi meu primeiro crepe em Paris. Foi feito por um simpático Monsieur na rue Norvins, em Montmartre. Não tenho idéia de quantas pessoas passam ali diariamente para serem servidas por suas habilidosas mãos. Só sei que as palavras trocadas com ele são poucas e tudo acontece muito rapidamente: damos o dinheiro e, em pouquíssimo tempo, recebemos o crepe quentinho. No máximo, um ou outro cliente pede um recheio extra, e a relação com o homem dos crepes se prolonga por alguns instantes a mais. Mas, enquanto fiquei próximo a ele, não o vi tendo que dizer seu nome nem contar como anda sua vida para ninguém.

Ok, o homem estava trabalhando, sei disso. Talvez isso explique sua expressão de indiferença diante da pequena multidão que aparecia em sua janela. Uma indiferença recíproca, claro. Afinal, aquele Monsieur devia saber que não era por mal que as pessoas o tratavam como uma máquina de fazer crepes. Pois todos ali estavam bem mais interessados nas outras atrações do local, como a basílica de Sacré-Coeur, a visão panorâmica de Paris que se tem naquele lugar, ou ainda, as centenas de lojas de souvenirs, que ocupam boa parte do espaço nas ruas do bairro.

Ver Paris da escadaria de Sacré-Coeur é algo que emociona. Montmartre é um dos pontos mais altos da cidade e a basílica fica bem no topo. Experimentei a alegria de reconhecer, ao longe, alguns pontos: a Notre Dame, o Panthéon e a torre de Montparnasse. E, ao ver esses grandes monumentos da França como se fossem miniaturas, tive uma dupla impressão: se, por um lado, podia pensar que aqueles pontos estavam literalmente debaixo dos meus pés, por outro, o sentimento de pequenez que tenho diante da pompa e do glamour dos marcos de Paris não diminuíram, pois eu sabia que aquele vasto horizonte escondia muitos deles. Sentia-me como tendo diante de meus olhos uma terra nova a ser desbravada.


Havia muita gente em Montmartre e isso me sufocava um pouco. Muita gente andando pelas ruas, muita gente na basílica e nas escadarias, muita gente nos cafés e nos bistrôs, muita gente nas lojinhas de souvenirs...



E, por falar em lojas de souvenirs, fiquei horrizado com a quantidade delas naquele lugar, todas abarrotadas de cartões postais, canecas, porta-trecos, bonés, ímãs de geladeira, broches, presilhas de cabelo, telas, coisas de escritório, caixinhas de música, pôsteres de todos os tamanhos e tudo mais que se possa imaginar com temas de Paris. Além, é óbvio, das camisetas com "I love Paris" e das infinitas variações da torre Eiffel em miniatura, inclusive os clássicos chaveiros, que continuo achando ridículos.

Pensar que toda aquela gente movimenta uma indústria de quinquilharias, os chamados souvenirs de Paris, é de arrepiar. Porque fico com a sensação de que Paris é só isso: um lugar rico em monumentos que marcam uma história de muitos séculos, mas que hoje servem apenas como temas para o mercado dos souvenirs, que reproduz em formato de brinquedo as imagens dessa história e o próprio nome da cidade. Paris é uma logomarca...

São esses os souvenirs de Paris, que as pessoas compram mesmo sem necessariamente saberem o que tudo aquilo representa. É ainda um pouco chocante para mim ver a história de um lugar (por mais crítico que eu possa ser em relação aos franceses) em escala tão reduzida, como se a Cidade Luz fosse um grande parque de diversões, ou ainda, um espaço lúdico onde se joga um jogo, no qual cada jogador tem como regra levar consigo algo da cidade que possa servir de prova de que esteve ali, em Paris.

Quando penso nas lembranças que gostaria de levar de Paris, não as procuro nesses objetos, nessas coisinhas (e o diminutivo é proposital, porque são coisas pequenas em sentido de importância mesmo). Prefiro ver este lugar de um ponto de vista mais humanizado. Quero me lembrar de Paris como um momento de minha história em que encontrei gente que só poderia encontrar aqui. Quando estiver de volta ao Brasil, quero pensar nesse tempo e me lembrar das pessoas que enriqueceram minha existência, seja academicamente falando, seja como experiência de vida mesmo (só o estranhamento do contato com elas já teria feito a viagem valer a pena). Pessoas que, para minha alegria, terão me contado coisas que jamais escreveriam em livros, nem em artigos, nem em blogs, nem mesmo em e-mails, mas que, por estarem ali comigo, "ao vivo", deram algo de si para mim. Estes serão, espero, meus souvenirs de Paris.

E quando digo isso, penso até mesmo nas pessoas com quem eu não tenha conseguido estabelecer grandes vínculos nem trocar muitas idéias, como aquele Monsieur dos crepes que encontrei em Montmartre, cujo nome desconheço, e que talvez eu nem volte a reencontrar. De todo modo, levarei daqui a lembrança das palavras extremamente significativas que disse a ele: "Merci beaucoup, Monsieur!"... Não, não era por causa do crepe de chocolate que pedi. Era a demonstração de um sentimento de gratidão a alguém que, querendo ou não, deixou uma marca singular de Paris em mim. Uma marca que nem mesmo um milhão de chaveiros de torrinhas Eiffel conseguiriam deixar.

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