terça-feira, 12 de abril de 2011

Nove meses

Com tantos colegas partindo de volta para o Brasil, acho impossível não pensar em minha própria volta, agora tão próxima. Mas o que mais me aflige não é tanto o choque da readaptação que terei que enfrentar, seja com os prováveis conflitos que surgirão quando eu comparar as coisas "no Brasil" e "em Paris", seja com a angústia de não conseguir compartilhar a experiência bela e triste com aqueles que nunca moraram aqui. Aliás, espero que as pessoas me perdoem quando eu preferir ficar mudo: pois o silêncio será a saída para não parecer arrogante como um apóstolo da civilização, e também para não me frustrar tentando dizer coisas que simplesmente não fazem sentido para ninguém.

Na verdade, preocupo-me mais com as representações que farei deste tempo: temo que a Paris que conheci - sobretudo a Paris imaginária que encontrei dentro de mim - mude muito quando eu mesmo tiver que esquecê-la. Temo que, em minha memória, ela se transforme a tal ponto que eu não possa mais reconhecer em seus traços esse não-sei-quê de intimidade que hoje me parece tão real. Ou também (o que seria igualmente horrível), que Paris, enquanto lembrança de um período sombrio, torne-se mais um fantasma na galeria de fantasmas que habitam em meu eu interior: fantasmas que me assombram fazendo com que eu sinta a falta de algo que não sei o que é, ou deixando-me confuso ao repetirem idéias contraditórias, como que amor só é eterno depois que passa, ou que ele e o esquecimento são inseparáveis...

Em setembro do ano passado, escrevi um texto que sempre releio quando algum colega parte de volta ao Brasil. Nele, coloquei aquelas palavras mágicas que, especialmente nessas horas, encantam um pouco o mundo-dos-que-ficam, esse lugar da falta, da ausência e da saudade:

"Quero dizer-te adeus, e não posso, Montevidéu - pois até o olhar dos teus cavalos me está prendendo a ti. Mas, se eu ficar, talvez nunca mais os veja, porque o ofício humano é triste, e facilmente se vicia: os olhos deixam de ver o que estão vendo sempre, e o coração se acostuma - e esquece-o... - aquilo que se faz maravilha constante... Assim, para te amar, é melhor que te deixe." (Cecília Meireles, Crônicas de viagem, vol. I. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998, p. 147)

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